RECIFE
O Mundo Maravilhoso dos Naufrágios |
Revista
Náutica -especial de verão 1999 | |
Texto:
Maurício Carvalho | |
Recife
está entre as capitais mais alegres e descontraídas do Brasil. Seu carnaval é
um dos mais agitados do país e suas praias estão entre as mais procuradas
por turistas do mundo inteiro. Além de todas as belezas naturais, a capital pernambucana ainda guarda um importantíssimo patrimônio histórico. Nas vizinhanças de Recife e Olinda travaram-se inúmeras batalhas decisivas para a história do nosso país. Os diversos fortes que guarnecem a região -- como o Forte das Cinco Pontas e o Forte Orange, de Itamaracá --são o registro desses tempos de heróis e sangue. Para os mergulhadores, entretanto, Recife pode ser considerada a "capital dos naufrágios". Nada menos que seis deles são visitados freqüentemente pelas operadoras da cidade: Areeiro, Chata de Noronha, Pirapama, Reboque, Vapor de Baixo e Vapor de Cima. Algumas características chamam a atenção nessas embarcações afundadas. Primeiro, o total desconhecimento dos nomes e da história da maioria delas. Apesar do rico folclore que envolve esses naufrágios, dados mais concretos são raros. Mas isso pouco importa. As águas quentes e claras de Recife, além da incrível fauna marinha que coloniza os destroços dessas embarcações, por si só já são um bom motivo para conhecê-los. | |
No
dia 24 de março de 1887, ao largo da Ponta de Pedras, ocorreu um dos piores acidentes
navais da costa brasileira de que se tem notícia. O vapor Pirapama
chocou-se violentamente contra o Vapor Bahia,
colocando-o a pique. Apesar de muito avariado, o Pirapama conseguiu retornar ao
porto de Recife, segundo conta-se, sem prestar socorro aos acidentados. Com um estrago irreversível, o navio foi dado como perdido e afundado dois anos depois. Hoje, o Pirapama está corretamente pousado no fundo do mar e com toda a linha de seu casco preservada. Na popa, parte mais alta dos destroços, resta pouco do casario, mas o leme continua em sua posição e apoiado no fundo. Nenhum dos conveses resistiu ao tempo. Sobraram apenas os suportes verticais que os apoiavam. No centro do Pirapama estão as máquinas do tipo Oscillating Engine que impulsionavam um par de rodas de pás, retiradas antes do afundamento. No Recife, quase todos os naufrágios estão bastante afastados da costa e o Pirapama não é exceção. Cerca de seis milhas o separam do continente, garantindo águas excepcionalmente claras, principalmente de outubro a maio. A beleza dos destroços, colorido por milhares de peixes, arraias e tartarugas, destaca-se mais ainda em contraste com a areia clara do fundo, fazendo do Pirapama um maravilhoso cenário. | |
Uma história
popular cerca de mistérios o naufrágio da Chata
de Noronha. Diz-se, em Recife, que em 1973 este navio fazia o transporte de material de construção entre o porto de Recife e Fernando de Noronha quando, durante uma tempestade no través da Praia do Janga, seu guindaste desabou causando o afundamento da embarcação. Sorte dos mergulhadores. A primeira impressão ao chegar no fundo é de uma completa confusão de ferros. A profundidade de 30 metros pode até sugerir uma ligeira narcose. No entanto, pouco a pouco a figura do navio começa a surgir claramente. A chata está ligeiramente adernada para bombordo, com o pouco que resta da proa enterrada na areia e o casco de estibordo parcialmente visível. Na popa, o casario sobre o compartimento do motor caiu de cabeça para baixo a bombordo dos destroços, deixando à mostra o grande motor diesel, o gerador e outros maquinários. O hélice e o leme estão quase enterrados. No casario se pode ver escadas, escotilhas e portas que permitem uma fácil penetração nos peque-nos compartimentos. A Chata de Noronha é um dos naufrágios mais afastados da costa de Recife. Por isso, as águas são oceânicas, de temperatura agradável, grande visibilidade e uma quantidade impressionante de peixes. Cardumes enormes de enxadas rodeiam os destroços, além de bijupirás, arraias e tartarugas. A profundidade entre os 26 até os 34 metros limita o tempo de fundo e pode criar a necessidade de descompressão. É bom mergulhar com um computador para otimizar o tempo de fundo encaminhando-se diretamente para a proa, parte mais funda. Assim, pode-se iniciar a exploração dos destroços até a popa. As correntes na região podem ser fortes, porém no verão o mar permanece calmo e quente, dispensando o uso de roupas de neoprene. Mas é bom ter alguma proteção para a pele. Outro naufrágio imperdível nas águas de Recife é o Vapor de Baixo. Como outros tantos de Pernambuco, pouco ou nada se sabe da história deste pequeno mas simpático vapor. É um dos destroços mais próximos do porto de Recife, mas nem por isso desinteressante. Afundado no ano de 1850 e bastante deteriorado pelo tempo, o Vapor de Baixo está apoiado corretamente no fundo, com grande parte de suas estruturas remanescentes enterradas. Apesar, de ser possível perceber junto ao fundo de areia o contorno geral do navio, não existe mais casco e caverna-mes expostos. Resta apenas o conjunto propulsor do navio, aliás, absolutamente imperdível para o mergulhador. Na proa, apenas dois ou três pedaços de ferro emergem da areia. Existem duas caldeiras cilíndricas que mantêm sua posição original. Todo o conjunto de tubulações deve ter sido retirado ou está enterrado. Dois metros atrás das caldeiras estão as máquinas a vapor do tipo Side Level Englne, com dois cilindros unidos por alavancas móveis ao sistema de rodas de pás. Curiosamente, caídas na popa estão quatro bombas de avião. Sabe-se que originalmente elas estavam caídas fora da embarcação e parece tratar-se de bombas de treinamento que foram jogadas ali posteriormente. De todos os naufrágios de Recife, o Vapor de Baixo é, sem dúvida, um dos mergulhos mais fáceis. Além da pouca profundidade -- no máximo 23 metros -- as pequenas dimensões do navio permitem uma exploração completa em um único mergulho. Mergulhadores com pouca experiência não vão enfrentar perigos aqui e ainda vão se deliciar com a visão colorida de enxadas, ciobas, frades e muitas outras espécies de peixes que usam os destroços como abrigo. | |
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OBS: Na matéria original constam outros fotos. |