Liberdade para o | |
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Revista Sub Nº
16, agosto 1996 | |
Texto
e Fotos: Maurício Carvalho | |
Pingüino,
California, Bezerra
de Menezes e Aquidaban são nomes comuns para
quem mergulha na região da Ilha Grande. Mas que tal variar um pouco? Neste número,
a revista Sub leva você para visitar um desconhecido e inocente condenado, pelo
acaso, à prisão perpétua. Utilizando o Sistema de Informações de Naufrágios (SINAU) as pilhas de documentos de pesquisa foram resumidas a rápidos toques no teclado do computador. Com isso, vários naufrágios, antes desaparecidos, começaram a pipocar a meu redor. Foi assim, que em dezembro de 95, me deparei com o Commandante Manoel Lourenço, um cargueiro do Lloyde Brasileiro, que teria afundado no Saco dos Dois Rios em 1927. Nesta enseada funcionava o instituto penal da Ilha Grande e por isso as cartas náuticas assinalavam área proibida a embarcações. Com a desativação do presídio em 1994, a restrição estava acabada. Era hora portanto, de conceder liberdade a este naufrágio. No primeiro final de semana livre, junto à equipe de mergulho da lancha Nanamall, seguimos em direção ao Saco dos Dois Rios. Uma análise rápida das condições do acidente, um mergulho em apnéia e localizavamos os destroços entre as duas pequenas ilhas da enseada. | |
O naufrágio | |
O Commandante Manoel Lourenço fazia a linha Rio de Janeiro-Santos, com escalas na enseada dos Dois Rios, Paraty, Villa Bela, Ubatuba e São Sebastião. No dia 16 de março, estava ancorado em sua primeira escala, descarregando suprimentos e 34 presos da colônia penal, quando foi acossado por um violento temporal. Acabou por encalhar, sendo jogado, pelo fortíssimo vento sudoeste, contra a laje entre as ilhas do Saco dos Dois Rios. Na madrugada do dia 17, já tendo passado por sobre a laje e estando preso entre as ilhas, o navio afundava, causando a morte de seu piloto e de um taifeiro. Agora o navio era tão prisioneiro quanto seus passageiros. | |
Os destroços | |
O
navio encontra-se desmantelado, por força das ondas, quando o vento de sudoeste
varre a enseada; mas também pelos trabalhos de recuperação dos destroços, evidentes
nas hélices de bronze, de onde foram cortadas as pás. Na parte mais rasa, está a popa, cujos destroços se encontram espalhados entre grandes rochas. Nela podem ser vistos os dois grandes eixos, ainda com suas passagens para o lado de fora do casco. Na ponta de cada eixo, estão os pés-de-galinha e os cubos dos hélices de pás atarracháveis. Caídos atrás da popa, estão o leme e seu volante, um guincho, turcos e alguns cabeços de amarração. Seguindo-se os longos eixos, poucas peças são encontradas. A profundidade vai aumentando, até atingir 14 metros numa bacia de areia, onde está a maior parte dos destroços. O conjunto de máquinas a vapor, do tipo Triple Expansion Engine de 92 NHP, repousa ao lado do final do eixo. À sua frente, está um grande guincho, ainda preso à estrutura do convés. Cinco metros adiante, estão as duas caldeiras aqua-tubulares, com 4 metros de diâmetro. Sua couraça muito comprometida parece mostrar que os destroços sofrem muito durante as tempestades de sudoeste. Em torno das caldeiras, pedaços do navio estão espalhados. Existe ainda uma grande seção da proa, guincho, olhais, cavername e chaparia. Apesar de não termos encontrado as âncoras, pedaços das correntes podem ser vistos enrolados em torno da base da laje, mostrando que o navio, ancorado originalmente do outro lado, passou sobre ela durante o naufrágio. | |
O mergulho | |
Apesar
de localizar-se do lado de fora da Ilha Grande, o Saco dos Dois Rios não possui
águas particularmente claras, devido ao deságüe dos dois riachos que dão o nome
ao local. No entanto, o fato de estar abrigado dentro de uma enseada tranqüila
faz deste naufrágio um excelente ponto de mergulho. A temperatura agradável e a baixa profundidade, de 6 a 14 metros, garantem um mergulho longo e fácil. Na parte mais rasa (popa), a visibilidade gira em torno dos 10 metros, já no fundo (proa), as ondas agitam o bolsão de areia, turvando a água. Com o vento leste o mar é tranqüilo, mas quando sopra o sudoeste forman-se ondas no interior da enseada, que quebram sobre o navio. Mesmo assim, o mergulho é possível, pois a laje protege os mergulhadores dos movimentos mais fortes. Recomendamos ancorar o barco no lado leste da enseada, nadar até próximo da laje, submergir e iniciar a exploração dos destroços da popa para a proa; a orientação subaquática deve ser cuidadosa, assim, no final do mergulho, não há preocupação com as ondas formadas na laje, podendo ser feito o retorno ao barco pela superfície. Parece estranho pensar que um navio afundado tenha permanecido recluso durante tanto tempo, assim como os presidiários que transportava. No final, presídio e navio, unidos em 1927 pela história, tiveram o mesmo triste destino, tornarem-se ruínas... Por tudo isso, venha mergulhar no Commandante Manoel Lourenço; depois de 69 anos de solitária, o prisioneiro de bom comportamento ganha a liberdade e agradece a visita. | |
Agradecimentos | |
Meus
agradecimentos a toda equipe Cana-Brava, que mesmo após nadar muito no "lodo",
devido a pistas furadas a procura de outros navios, ainda me deu voto de confiança
para encontrarmos este naufrágio. Como é nossa meta, em cada edição, vamos apresentar os naufrágios mais famosos do Brasil, ou outros desconhecidos do grande público, quebrando o véu de mistério que os envolve. Aguarde, pois mais novidades vêm por aí. | |
FICHA
TÉCNICA |
Dados
do Naufrágio |
Dados
Técnicos |
Nome do Navio: Commandante Manoel Lourenço. | Nacionalidade: brasileira. |
Data do Afundamento: 17.03.1927. | Armador: Lloyde Brasileiro (1891). |
Localização: Saco dos Dois Rios - Ilha Grande - RJ. GPS: 23º11'000"S & 044º10'875"W. | Ano de fabricação: 1889. |
Posição: Entre as dual ilhas da enseada | Estaleiro: Stettiner Maschinenbau AG Vulcan. |
Profundidade: 6 a 14 metros. | Medidas:
Comprimento: 60,5m. Boca: 9,6m. |
Estado: desmantelado. | Tipo de Navio: Cargueiro a vapor. |
Carga: carga variada e passageiros. |
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NA PISTA do PIRAPAMA |
Sub; Edição Nº 15. Informações complementares enviadas pela operadora Expedição Atlântico, de Recife. Posição em GPS do naufrágio: 08º03'38" S & 034º46'97" W. |
Maurício Carvalho
é biólogo, instructor trainer PDIC, especialista em Naufrágio; ministrando curso
do tema em todo o Brasil. |
OBS: Na matéria original constam outros fotos. |