Destino: naufrágio | ||
As Armadilhas do Nosso Litoral | ||
O São Luiz é mais uma vítima da falta de cartografia da |
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Revista
Mergulho, Ano XII - Nº 143 - Junho/2008 |
Texto:
Maurício Carvalho |
A
primeira vez que tentei atingir o São
Luiz foi quase catastrófica. Partimos um grupo de amigos em um pequeno
barco de pescadores de Torres ao norte de Natal, Rio Grande do Norte. Quem nos
guiava era um daqueles pescadores que dizem "saber tudo de mar". O mar
agitado, com ondas e vento forte castigaram a navegação de mais
de três horas. Chegando ao local apontado pelo pescador, ele abriu o porão do barco e lá no fundo estava uma daquelas revelações que marcam a história de mergulho de qualquer um. O famoso narguilê, feito com mangueira de jardim, bujão e gás, como tanque volumétrico e ligado a um filtro feito de cano PVC preenchido com cordas e pasta de dente. Já havia ouvido falar do apetrecho, mais não estava preparado para ver o pescado lançar-se ao mar com ele e permanecer por mais de 1 hora a 30 metros procurando o naufrágio. Para piorar, a longa espera fez um dos colegas decidir aliviar a bexiga no mar e acabou por soltar- se do barco. A desgraça estava feita! Em pouco tempo, tínhamos um colega derivando rapidamente para o horizonte e um pescador que se recusava a subir, mesmo puxado com energia pela mangueira. Após dez minutos de luta, embarcamos o pescado e partimos em busca de nosso colega, que, a essa altura, não era nem mais visto no horizonte. |
Boa
parte da estrutura do São Luiz ainda pode ser vista por mergulhadores |
| Não
sabia se ficava de olho no mar ou nas articulações do pescador,
que para mim iriam, entortar em breve pela gravidade da DD. Após uma eternidade localizamos o colega, que completamente "aliviado" retornou ao barco. E o naufrágio? nada... O pescador o "perdeu". Parecia um preço alto a pagar para atingir um dos naufrágios menos conhecido do Brasil. Meu retorno ao São Luiz, foi muito diferente. A bordo do super confortável e seguro Enterprise, o São Luiz se mostrou um belo naufrágio. Assim como nós, foi pego por uma das armadilhas de nosso litoral. O São Luiz era um importante navio da Companhia de Comércio e Navegação que fazia a ligação ente os portos do nordeste e sul do Brasil. A CCN foi uma da mais importantes companhias de transporte do Brasil. Proprietária de diversos navios de grande porte, a companhia fazia a linha entre portos do Nordeste e do Sul e Sudeste do Brasil, além de algumas linhas a portos da Europa e até a África. Como outras empresas de navegação a vapor, a Companhia de Comércio e Navegação sofreu fortes perdas por navegar nas costas do Brasil sem levantamento cartográfico e cobertura de faróis adequada. Ao longo de sua existência a empresa perdeu o Guayba (Cabo Verde), Oswaldo Aranha, Paraná (França), Piratini (África), Tietê, Parayba e Tijuca (Inglaterra), além do São Luiz. Tantas perdas acabaram por fazer a companhia encerrar suas atividades sendo incorporada pelo Lloyde Brasileiro. O São Luiz começou sua história no Brasil ao ser adquirido em 1906 da empresa inglesa Anchor Line's, onde era registrado como Núbia. Com 20 anos de serviço, era um dos maiores navios da frota com 1925 toneladas. Segundo a Revista da Liga Marítima Brasileira, em janeiro de 1911 o São Luiz chocou-se com uma formação rochosa que se estende à cerca de 17 milhas ao largo do Rio Grande do Norte, conhecida como a Risca do Zumbi. Até meados do século XX, embora em alguns pontos cheguem muito próxima a superfície, esta região ainda era muito pouco mapeada. |
| Muita vida marinha nas proximidades dos escombros do velho cargueiro |
Apoiado no fundo a 27 metros, os destroços
estão alinhados ainda na estrutura do vapor, mas já avançado
estado de desmanche. |
As fortes correntes e mar agitado da região, revolvem o fundo e levantam muitas algas que flutuam em torno do navio. Além de uma grande variedade de peixes e esponjas alguns tubarões também utilizam os destroços como abrigo, tornando este naufrágio ainda mais belo. |
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Maurício Carvalho é biólogo, instrutor especialista em naufrágios, autor do SINAU (Sistema de Identificação de Naufrágios) e responsável pelo site Naufrágios do Brasil. | |
Veja mais em: Naufrágio do São Luiz | |