Revelando
os tesouros do fundo do mar |
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Revista
Geográfica Universal, setembro de 1991 |
Texto
de MAURICIO CARVALHO Fotos de MARCUS WERNECK |
Os navios afundados guardam muitos mistérios em suas estruturas corroídas. E excitante pensar que bravos marinheiros os manobravam para singrar os oceanos ou mesmo envolver-se em lutas sangrentas com piratas para defender suas valiosas cargas. Por muitos séculos, essas embarcações afundadas permaneceram longe do alcance de nossa curiosidade. Porém, com a descoberta e o aprimoramento dos equipamentos de mergulho, o homem afastou o véu dos segredos e pôde atingir seus sonhos: conhecer de perto os naufrágios. E quando nada-mos calmamente pelos corredores das embarcações, ouvindo apenas o barulho de nossa própria respiração, podemos sentir a presença mágica do lugar, com as incontáveis formas de vida que colonizaram seus compartimentos. | ||
Os
navios afundados -- naufrágios, no jargão dos mergulhadores -- sempre foram alvo
de caçadores de tesouros, que deles tentavam retirar alguma coisa da carga valiosa
que afundara junto com a embarcação. As primeiras tentativas foram tímidas, com
os aventureiros recuperando objetos espalhados pelo fundo. Mas com o passar dos
anos e o desenvolvimento de técnicas específicas, foi possível criar um método
de recu-peração de objetos submersos, que hoje tem o auxílio de detetores magnéticos
e robôs, além de minuciosos estudos científicos. Mesmo com a utilização das técnicas modernas e os recursos empregados nas recuperações, as histórias de sucesso são raras. Mel Fisher, presidente da Treasure Salvours, uma empresa exclusiva de resgates, tornou-se famoso ao recuperar um valioso tesouro das profundezas do mar. | ||
As pesquisas
levaram Fisher aos destroços do Nuestra Señora de Atocha, um galeão que afundou
em 1622 nas águas rasas e quentes do Caribe, rendendo ao mergulhador mais de 400
milhões de dólares em objetos valiosos. Para a maioria, no entanto, o prêmio é
o insucesso, fazendo com que inúmeros pesquisadores abandonem suas buscas muitos
anos e dólares depois de iniciadas. Sobre esses aventureiros em geral ainda paira o estigma de piratas que pilham os objetos encontrados. Vale esclarecer que os caçadores de tesouros são na maioria estudiosos que gastam muitos de seus anos em bibliotecas, levantando dados que possam levar a um navio que tenha relevância histórica. Isto é o que acontece no Brasil, já que, conforme a Lei Nacional que regulamenta a exploração de submersos, cabem à União todos os direitos sobre os tesouros que por-ventura forem encontrados pelos mergulhadores. 0 que não impede que dezenas de aventureiros se dediquem a procurar tesouros pelos oito mil quilômetros da costa bra-sileira, rica em naufrágios, pois há dois mil deles catalogados. Embora a maioria não esteja adequadamente localizada, um grande número é freqüentemente visitado por mergulhadores em busca apenas de aventura. E o que acontece com o Alfama de Lisboa, afundado em agosto de 1809, no litoral de Recife, e que é considerado um dos mais antigos naufrágios brasileiros. De suas estruturas frágeis, já foram recuperadas por amadores peças valiosas em cerâmica, porcelana e prata, em perfeito estado de conservação. |
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Em Pernambuco também se
encontra o mais importante naufrágio brasileiro: o do navio Santa Rosa. Esta embarcação
foi a pique no ano de 1726, próximo ao cabo de Santo Agostinho, com 26 toneladas
de ouro a bordo. A valiosa carga afundada transformou o Santa Rosa no segundo
naufrágio mais valioso do mundo. |
É
preciso saber mais do que apenas mergulhar para ser um caçador de tesouros. A
recuperação e principalmente a restauração e a conservação das peças encontradas
re-querem estudo e técnicas adequadas, além de altos investimentos financeiros.
Há mergulhadores despreparados que retiram do mar verdadeiros patrimônios históricos
sem ter noção do que encontraram, causando, muitas vezes, perda total do achado.
Além disso, localizar e identificar um navio nem sempre é fácil, ainda mais saber
de sua carga, já que seus dados estão perdidos nos séculos. O trabalho deve ser
feito em conjunto entre os técnicos e seus assistentes, que estudam .as possibilidades
e cuidam da manutenção dos objetos. | |
Não
é apenas a ação contínua do mar que prejudica a retirada dos objetos dos navios.
No oceano, qualquer suporte rígido é utilizado por espécies animais e vegetais,
para dele extrair alimento e obter sustentação. As embarcações são verdadeiros
chamarizes para estes seres vivos, tornando-se com o passar dos séculos recifes
cobertos de orga-nismos, o que dificulta sua identificação e recuperação. Assim,
a fauna dos naufrágios é sempre exuberante. Além dos minúsculos animais que aderem
às diversas peças, mui-tos peixes grandes, como tubarões e raias, as utilizam
como repouso. E fácil imaginar a surpresa de alguém deparar com um tu-barão de
mais de dois metros dormindo em algum compartimento. | |
As rodas de
propulsão do vapor Bahia, que afundou ao colidir com outro navio no litoral de
Olinda, em março de 1887, são agora habitadas por inúmeros cardumes, o que proporciona
um espetáculo inesquecível aos que se aventuram por estas águas. Além do tubarão, o peixe-pedra ou mangangá (Scorpaena sp.), também é um assíduo morador dos destroços submersos. O seu forte veneno, secretado por suas glândulas ligadas aos espinhos na nadadeira dorsal, representam um grande perigo para qualquer mergulhador, desavisado ou não. Camuflado dentro do navio, o peixe dificilmente é percebido, o que facilita que atinja o homem que nele toque. |
Para muitos mergulhadores de naufrágios é triste constatar que sua descoberta não resistiu à ação dos tempos. Como exemplo, o galeão português São Paulo, que, embora possuísse 840 toneladas e vários canhões, não suportou a batalha contra os piratas no cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, e afundou no ano de 1652. Fa-moso pela sua antiguidade, o navio foi por muito tempo motivo de cobiça entre os caçadores de tesouros. Mas, descoberto o local de seu túmulo no mar, constatou-se que toda a sua estrutura de madeira se desintegrata, sobrando apenas as âncoras e alguns canhões. Uma decepção para os cobiçosos caçadores, mas um naufrágio historicamente importante, e ponto de honra no currículo de qualquer mergulhador. |
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OBS: Na matéria original constam outros fotos. |