Oque
é, Oque é? |
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Revista
Mergulho, ano VIII, Nº 111 - 2005 | ||
Por:
Maurício Carvalho | ||
Reconhecer
a montanha de ferros retorcidos significa aproveitar mais o mergulho em naufrágios
- e até entender a história deles. | ||
Texto
original enviado a revista | ||
Naufrágios Você sabe o que está vendo? | ||
Muitos
mergulhadores mantêm uma relação de check list com os pontos
de mergulho. Um mergulho no local e perdem o interesse, como se voltar ao mesmo
ponto de duas ou mais vezes fosse desnecessário. Ainda neste processo,
passam pelo fundo em alta velocidade tentando cobrir a maior distância possível
do cenário subaquático. O resultado desse procedimento é
um alto consumo de ar, pouco tempo para observar os detalhes e a conclusão
de que muitos pontos de mergulho são pouco interessantes. Segundo as sábias palavras do instrutor J. Dias "é como se um cinema passasse sempre o mesmo filme". Nos naufrágios, as conseqüências são ainda mais negativas; pois o mergulhador apressado pouco compreende das peças e do que aconteceu com o navio e sequer observa a fauna que o coloniza e que muda a cada instante. Para
reverter esse processo, é fundamental que os mergulhadores percebam os
detalhes do cenário, vasculhem com os olhos cada reentrância habitada
por um ser marinho, observem cada contorno das peças do navio e sua participação
no conjunto cênico do naufrágio. Assim, é possível
compreender como um navio e o naufrágio estão estruturados no fundo. | ||
Entendendo o Naufrágio | ||
Vamos
apresentar alguns dos pontos básicos para a compreensão do que é
freqüentemente encontrado nos naufrágios mais famosos. Chegando ao fundo, é necessário rapidamente identificar a parte do naufrágio em que estamos para dar seguimento ao planejamento de mergulho. Para isso, será fundamental saber reconhecer as principais peças de um navio. | ||
A Proa | ||
Na
proa podem ser encontrados os escovéns; que fixados ao casco davam passagem
a corrente em direção ao guincho. A vantagem do reconhecimento dessas
peças é que elas permanecem no fundo, enquanto as tradicionais âncoras,
e correntes são freqüentemente roubadas ou estão afastadas
dos destroços. No convés de proa também estão os guinchos de âncora, que funcionavam a vapor e se caracterizam pelas engrenagens e polias. Em naufrágios em que houve um choque frontal violento, a proa pode estar completamente descaracterizada, necessitando buscar outras peças menos clássicas. | ||
Meia-nau | ||
À medida que o mergulhador segue em direção a meia-nau, passa por estruturas de porão e mastros. O casco deve ser utilizado como orientação. As cavernas, que são "vigas" que reforçavam o casco pelo lado de dentro dão boas dicas do que aconteceu. Quando elas estão visíveis e viradas para superfície, sabemos que o casco se abriu para o lado de fora. Quando o casco está liso e as cavernas estão para baixo provavelmente o navio adernou, desmontando o casco sobre o restante dos destroços. No
centro da embarcação está uma das áreas mais importante
para qualquer especialista. Aí estão o conjunto de caldeiras e máquinas.
As caldeiras mais freqüentes são as cilíndricas (aquatubulares).
Elas possuem na frente grandes aberturas circulares chamadas fornalhas, onde queimava
o carvão; as tampas normalmente já não estão mais
presentes. Acima delas, encontramos um grande número de furos alinhados,
chamados de trocadores de calor. É comum encontrar em torno das caldeiras,
carvão e tijolos refratários, usados como isolante térmico.
As máquinas de propulsão sofreram ao longo dos 150 anos de navegação a vapor mudanças constantes, o que, como conhecimento adequado, permite identificar com muita precisão o período de construção. Foram detalhes como este que permitiram que eu identificasse o período de construção do navio Rosalinda e conseqüentemente pudesse descobrir que havia um erro na sua datação. Para se entender o naufrágio é preciso estudar vários sistemas de propulsão como o Direct Engine do Califórnia (Angra dos Reis, RJ.), Oscilating Engine do Pirapama (Recife, PE.) e Compound Engine do Tocantins (Queimada Grande - SP). As máquinas, pelo seu tamanho, dificilmente são retiradas do naufrágio. Passando pelas máquinas, o mergulhador já pode ter idéia se o naufrágio é um veleiro, vapor de Rodas ou dotado de hélices. As rodas são muito características e estão sempre no centro da embarcação em cada um dos bordos da embarcação Nas laterais da embarcação também estão as linhas de malaguetas, que serviam para fixar o cordame das velas. O que permitem perceber que se trata de um navio misto. Essas peças permitiram a recente identificação do Guadiana em Abrolhos. | ||
Popa | ||
A
partir das máquinas, podemos seguir o(s) eixo(s) até a popa do navio,
nela com alguma sorte estão o hélice e leme, no entanto os hélices
de bronze são retirados da maioria dos naufrágios, restando ao mergulhador
reconhecer o volante do leme, peça responsável por seu movimento.
A popa costuma ser a parte mais íntegra do naufrágio. Conhecendo
a dinâmica de um naufrágio o mergulhador treinado pode praticamente
ler nas peças o que o destino guardou para o navio após o afundamento.
Além de aproveitar melhor o mergulho, sua segurança será
muito reforçada. Em
alguns naufrágios do Brasil já tive a oportunidade de mergulhar
centenas de vezes e sempre os destroços me reservaram alguma surpresa.
Não se imponha conhecer todo o naufrágio em um único mergulho.
Procure nadar com calma pelo navio concentrando sua atenção em uma
determinada seção do navio. Observe as peças em todas as
direções, procure mentalmente ligá-las umas com as outras
e você perceberá que o navio voltará a se formar em torno
de você. | ||
OBS: Na matéria original constam outros fotos. |